O bem-vindo e a Dona Benvinda (Sobre ser bem-vindo)

Minha falecida avó se chamava Benvinda, mãe de meu pai. Dona Benvinda deu boas-vindas para quinze filhos. Hoje em dia nos soa impressionante, não é? Mais impressionante ainda ter ensinado todos os filhos a ler, dando-lhes também as boas-vindas ao mundo das palavras, ainda que ela mesma fosse analfabeta.

Lacan disse uma vez que o significante (uma palavra que desliza) mais importante de nossas vidas é nosso nome. Sendo assim, o que mais me admira sobre os nomes das pessoas é como eles invariavelmente se emaranham na história de cada sujeito. Dona Benvinda não era diferente e decerto lhe caiu bem esse nome. Em todas as vezes que entrei em sua casa, lá estava ela com toda simplicidade do mundo, cafezinho passado, comida sendo preparada no fogão. Ia puxando os filhos e netos pra dentro de casa e dizendo : “Seja bem-vindo, fica à vontade!”

Talvez seja interessante tomar essa figura tipicamente mineira como exemplo de algo valioso para nossa clínica, exemplo de um talento incrível e ao mesmo tempo despretensioso para receber os outros. Contardo Calligaris, em seu livro Cartas a um jovem terapeuta, recomenda que não nos façamos de tão importantes ao receber alguém. O mineiro nos ensina apenas que o café esteja sempre quentinho e que o sorriso receptivo nos convide a entrar. Em psicanálise, depois que se entra, cabe a cada um descobrir o mistério do que vem pela frente.

A habilidade de fazer o outro se sentir bem-vindo em nosso espaço é uma virtude desejável, e é uma das habilidades interessantes para um analista que recebe alguém em seu consultório. Receber sem moralismos, sem tentar encarcerar o desejo do outro por ele ser como é e indicar que sempre há direções possíveis para o sujeito faz com que a chegada seja boa, que se construa um laço com aquele analista.

Você pode saber, aqui sempre tem cafezinho. Afinal, seja bem-vindo.

Foto 2: Benvinda e eu.